Para suportar uma cidade que funciona sem pausa, é preciso contar com profissionais dispostos a inverter o relógio biológico e a dispensar a luz do sol. Pode parecer simples: à primeira vista, o sono é o primeiro, e único, inimigo a ser dobrado. No Brasil, não há dados estatísticos sobre o contingente de profissionais que trabalham durante à noite, mas estima-se que eles somem 10% da população economicamente ativa. Apesar de a lei prever que esses profissionais recebam um adicional no salário, a recompensa financeira pode não valer o desgaste da jornada.
Reproduzimos aqui no blog, uma importante entrevista publicada no jornal Folha de São Paulo com a professora pós-doutora do departamento de saúde ambiental da Faculdade de Saúde Pública da USP Claudia Moreno, que estuda o tema há mais de 20 anos. Para ela, o trabalhador noturno não relaciona o aparecimento de doenças com o horário da labuta, mas esse é um de seus principais fatores.
FOLHA - Trabalhar à noite é como trabalhar durante o dia?
CLAUDIA MORENO - Não. A espécie humana é essencialmente diurna. Isso é geneticamente determinado, ou seja, não é tão simples de inverter. Quem trabalha à noite precisa saber que não terá o mesmo desempenho na madrugada como teria à tarde, pois o organismo não vai responder da mesma forma.
CLAUDIA MORENO - Não. A espécie humana é essencialmente diurna. Isso é geneticamente determinado, ou seja, não é tão simples de inverter. Quem trabalha à noite precisa saber que não terá o mesmo desempenho na madrugada como teria à tarde, pois o organismo não vai responder da mesma forma.
FOLHA - Quais são os principais efeitos na saúde do profissional?
MORENO - De imediato, ele passa a sentir os efeitos do débito de sono, porque não vai conseguir dormir durante o dia como faz à noite. Então, podemos dizer que, em geral, quem dorme de dia tem duas horas a menos de sono. Esse déficit vai gerar dor de cabeça, fadiga e sintomas relacionados ao estresse. Com o passar do tempo, o trabalhador começará a ter queixas de má digestão -isso pode se transformar em gastrite, úlcera ou em problemas gastrointestinais. Além disso, há problemas cardiovasculares, como hipertensão, e distúrbios psíquicos, como a depressão. Mas as principais queixas estão relacionadas ao sono: a pessoa deita para dormir e não consegue, tem dificuldades para adormecer e manter o sono. Depois, apresenta o que chamamos de "despertar precoce": acorda antes da hora que gostaria e não consegue dormir mais.
MORENO - De imediato, ele passa a sentir os efeitos do débito de sono, porque não vai conseguir dormir durante o dia como faz à noite. Então, podemos dizer que, em geral, quem dorme de dia tem duas horas a menos de sono. Esse déficit vai gerar dor de cabeça, fadiga e sintomas relacionados ao estresse. Com o passar do tempo, o trabalhador começará a ter queixas de má digestão -isso pode se transformar em gastrite, úlcera ou em problemas gastrointestinais. Além disso, há problemas cardiovasculares, como hipertensão, e distúrbios psíquicos, como a depressão. Mas as principais queixas estão relacionadas ao sono: a pessoa deita para dormir e não consegue, tem dificuldades para adormecer e manter o sono. Depois, apresenta o que chamamos de "despertar precoce": acorda antes da hora que gostaria e não consegue dormir mais.
FOLHA - Pode-se dizer que, biologicamente, esse profissional está mais disposto a desenvolver doenças?
MORENO - Sim. Podemos afirmar que trabalhar à noite faz mal para a saúde. O Ministério da Saúde edita um manual de doenças relacionadas ao trabalho usado pelos peritos para definir se uma doença é ocupacional. O último, de 2001, inclui as conseqüências do trabalho noturno. Ou seja, no Brasil, isso já é reconhecido por lei.
MORENO - Sim. Podemos afirmar que trabalhar à noite faz mal para a saúde. O Ministério da Saúde edita um manual de doenças relacionadas ao trabalho usado pelos peritos para definir se uma doença é ocupacional. O último, de 2001, inclui as conseqüências do trabalho noturno. Ou seja, no Brasil, isso já é reconhecido por lei.
FOLHA - As empresas estão atentas a isso? O que têm feito?
MORENO - Eu diria que nos últimos anos essa preocupação tem aumentado, mas ainda é muito pequena. Na maioria das indústrias, o que é servido no almoço também é no jantar. Uma feijoada vai estar lá tanto de dia como à noite. Aí há um problema sério: as nutricionistas das firmas dizem que os trabalhadores teriam dificuldades em aceitar que precisam de alimentos diferentes dos demais.
MORENO - Eu diria que nos últimos anos essa preocupação tem aumentado, mas ainda é muito pequena. Na maioria das indústrias, o que é servido no almoço também é no jantar. Uma feijoada vai estar lá tanto de dia como à noite. Aí há um problema sério: as nutricionistas das firmas dizem que os trabalhadores teriam dificuldades em aceitar que precisam de alimentos diferentes dos demais.
FOLHA - O trabalhador conhece riscos e direitos da atividade noturna?
MORENO - Muito pouco. Uma das frases muito comuns que ouvimos é a de que o trabalhador "se acostuma". Isso não é bem verdade. Existem as pessoas mais matutinas e as mais vespertinas -estas têm melhor desempenho no período noturno. Mas existem, por exemplo, pessoas que simplesmente não suportam a função. Então, quem está trabalhando à noite é alguém que conseguiu tolerar esses horários. Mesmo assim, pode ter problemas gastrointestinais sem saber que isso está correlacionado ao trabalho noturno que desenvolve.
MORENO - Muito pouco. Uma das frases muito comuns que ouvimos é a de que o trabalhador "se acostuma". Isso não é bem verdade. Existem as pessoas mais matutinas e as mais vespertinas -estas têm melhor desempenho no período noturno. Mas existem, por exemplo, pessoas que simplesmente não suportam a função. Então, quem está trabalhando à noite é alguém que conseguiu tolerar esses horários. Mesmo assim, pode ter problemas gastrointestinais sem saber que isso está correlacionado ao trabalho noturno que desenvolve.
FOLHA - As conseqüências podem se agravar com o tempo?
MORENO - Sem dúvida. Existem efeitos a longo prazo. Com mulheres, por exemplo, há casos de problemas de reprodução, alteração do ciclo menstrual e aborto espontâneo. Hoje, o que se recomenda é que quem tem intenção de engravidar não trabalhe à noite, e que gestantes também evitem esse trabalho nos primeiros meses. Muitas vezes a pessoa não relaciona o problema ao horário de trabalho por puro desconhecimento.
MORENO - Sem dúvida. Existem efeitos a longo prazo. Com mulheres, por exemplo, há casos de problemas de reprodução, alteração do ciclo menstrual e aborto espontâneo. Hoje, o que se recomenda é que quem tem intenção de engravidar não trabalhe à noite, e que gestantes também evitem esse trabalho nos primeiros meses. Muitas vezes a pessoa não relaciona o problema ao horário de trabalho por puro desconhecimento.
FOLHA - Diante de todos esses fatos, o que leva um trabalhador a desejar trabalhar à noite?
MORENO - São vários os fatores, mas em primeiro lugar está o adicional noturno, que é um aumento na renda. O profissional também pode querer usar o dia para outras atividades, como cuidar dos filhos, o que é comum entre as mulheres. Por fim, outro argumento é a facilidade do ir e vir durante a noite, por haver menos trânsito para os que moram longe.
MORENO - São vários os fatores, mas em primeiro lugar está o adicional noturno, que é um aumento na renda. O profissional também pode querer usar o dia para outras atividades, como cuidar dos filhos, o que é comum entre as mulheres. Por fim, outro argumento é a facilidade do ir e vir durante a noite, por haver menos trânsito para os que moram longe.
FOLHA - Há como render mais?
MORENO - A pessoa que trabalha à noite tem de perceber que ela não é igual ao que é durante o dia. E aqui fica uma sugestão para o empregador: é importante que o trabalhador possa cochilar ao menos 20 minutos [durante o expediente], o que recupera o nível de alerta e reduz a ocorrência de falhas. Um cochilo pode evitar acidentes.
MORENO - A pessoa que trabalha à noite tem de perceber que ela não é igual ao que é durante o dia. E aqui fica uma sugestão para o empregador: é importante que o trabalhador possa cochilar ao menos 20 minutos [durante o expediente], o que recupera o nível de alerta e reduz a ocorrência de falhas. Um cochilo pode evitar acidentes.
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